É POSSÍVEL A INCLUSÃO DA DESPESA DE CAPATAZIA NA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO?

Cinge-se a controvérsia em saber se o valor pago pelo contribuinte que importa mercadorias ao Porto, referente às despesas incorridas após a chegada do navio, tais como descarregamento e manuseio da mercadoria (capatazia), deve ou não integrar o conceito de “Valor Aduaneiro”, para fins de composição da base de cálculo do Imposto de Importação.

Cabe informar, de início, que o Acordo de Valoração Aduaneira, com a redação que lhe foi conferida no Uruguai, em 1.994, foi promulgado no Brasil pelo Decreto 1.355/94 e assim dispõe, em seu artigo 8º, item 2, no que aqui importa:

“(…)

  1. Ao elaborar sua legislação, cada Membro deverá prever a inclusão ou a exclusão, no valor aduaneiro, no todo ou em parte, dos seguintes elementos: (a) – o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; (b) – os gastos relativos ao carregamento descarregamento e manuseio associados ao transporte das mercadorias importadas até o porto ou local de importação; e (c) – o custo do seguro […]”

Porém, o Decreto 6.759/09, que substituiu o Decreto 4.543/02, referido no acórdão recorrido, assim determina, no tocante ao valor aduaneiro:

“Art. 77. Integram o valor aduaneiro, independentemente do método de valoração utilizado (Acordo de Valoração Aduaneira, Artigo 8, parágrafos 1 e 2, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994; e Norma de Aplicação sobre a Valoração Aduaneira de Mercadorias, Artigo 7º, aprovado pela Decisão CMC nº 13, de 2007, internalizada pelo Decreto nº 6.870, de 4 de junho de 2009): ( Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 15 de junho de 2010 )

I – o custo de transporte da mercadoria importada até o porto ou o aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;

II – os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I; e

III – o custo do seguro da mercadoria durante as operações referidas nos incisos I e II.”

Ocorre que, o texto do § 3º, do art. 4º, da Instrução Normativa da Secretaria da Fazenda Nacional, cuja (i)legalidade se pretende demonstrar neste artigo, estabelece que:

“Determinação do Valor Aduaneiro

Art. 4 º Na determinação do valor aduaneiro, independentemente do método de valoração aduaneira utilizado, serão incluídos os seguintes elementos:

I – o custo de transporte das mercadorias importadas até o porto ou aeroporto alfandegado de descarga ou o ponto de fronteira alfandegado onde devam ser cumpridas as formalidades de entrada no território aduaneiro;

II – os gastos relativos a carga, descarga e manuseio, associados ao transporte das mercadorias importadas, até a chegada aos locais referidos no inciso anterior; e

III – o custo do seguro das mercadorias durante as operações referidas nos incisos I e II. […]

  • 3 º Para os efeitos do inciso II, os gastos relativos à descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional serão incluídos no valor aduaneiro, independentemente da responsabilidade pelo ônus financeiro e da denominação adotada.”

Certo é que, da leitura dos dispositivos acima que, enquanto o Acordo de Valoração Aduaneiro e o Decreto 6.759/09 se referem à despesas com carga, descarga e manuseio das mercadorias importadas até o porto alfandegado, a Instrução Normativa se refere a gastos relativos à descarga no território nacional.

Por seu turno, nos termos do artigo 40, § 1º, inciso I, da atual Lei dos Portos (Lei 12.815/2013) o trabalho portuário de capatazia é definido como a “atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário” (grifo nosso).

Com base no conceito retro mencionado, tem-se que, a realização dos referidos serviços (de capatazia) ocorre em momento posterior à conclusão da realização do transporte do produto importado, já no porto situado em território nacional. Portanto, as despesas com os serviços referentes à circulação e manuseio das mercadorias já dentro do estabelecimento portuário termina por abranger despesas realizadas após a chegada até o porto alfandegado.

Diante disto, cabe concluir que o artigo 4º, § 3º da Instrução Normativa 327/03 da SRF  extrapola os limites do Acordo Internacional e da legislação aduaneira acerca da composição do valor aduaneiro, cuja previsão é clara no sentido de que apenas podem ser computadas as despesas até o local de importação, excluindo-se, assim, aquelas ocorridas entre a chegada da mercadoria no porto brasileiro (atraque da embarcação) e o seu efetivo desembaraço aduaneiro.

Dessa forma, entendo que o artigo 4º, § 3º da Instrução Normativa 327/03 da SRF, ao permitir a inclusão dos gastos com descarga da mercadoria do veículo de transporte internacional no território nacional no valor aduaneiro é ilegal, pois é contrário aos limites impostos pelo Acordo de Valoração Aduaneira e pelo Decreto 6.759/09.

Além disto, cabe ressaltar que, a referida Instrução Normativa, ademais, termina por permitir que o valor cobrado pelos portos para a realização do serviço de capatazia seja tributado pelo Imposto de Importação, ampliando, por via oblíqua, a base de cálculo do referido tributo, em claro desrespeito ao Princípio da Legalidade Estrita, previsto no artigo 150, I, da Constituição Federal.

Em precedente mais recente, a Ministra Assusete Magalhães, do Superior Tribunal de Justiça, no Agravo em Recurso Especial nº 1.249.528/RS, entendeu que ao incluir os valores gastos com capatazia na constituição do valor aduaneiro, para fins de cobrança do Imposto de Importação, a Receita Federal extrapolou seus limites de regulamentação da legislação federal.

Em sua decisão, a ministra afirmou que a Instrução Normativa da Receita Federal que permite a cobrança (IN/SRF 327/2003) ampliou, sem amparo legal, a base de cálculo do Imposto de Importação, em afronta ao princípio da legalidade tributária.

Assusete esclarece que o Decreto 6.759/2009, em observância ao Acordo de Valoração Aduaneira, afirma que integram o valor aduaneiro os custos de carga e descarga efetuados até a chegada das mercadorias no porto do país de importação, não podendo ser estendidos aos valores pagos após a chegada ao porto ou aeroporto de destino, no país importador.

“O limite para a inclusão dos custos de transporte, e de custos a ele associados, no valor aduaneiro, como disposto, é a chegada da mercadoria ao porto ou aeroporto alfandegado de descarga, no país importador. A partir desse momento, os valores despendidos com a movimentação da mercadoria não mais poderão ser incluídos no valor aduaneiro, para fins de incidência do Imposto de Importação, sendo, portanto, descabida a inclusão dos gastos com capatazia, efetuados no porto do país de destino, na constituição da base de cálculo do Imposto de Importação”, complementou.

Posto isto, cabe concluir que as importadoras de mercadorias que, nos últimos 5 anos, vem pagando imposto de importação sobre despesas incorridas após a chegada do navio, tais como descarregamento e manuseio da mercadoria (capatazia), poderão acionar o Judiciário para poder suspender a exigibilidade desta cobrança, bem como requerer a restituição/compensação dos últimos 5 anos.

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